José Henrique Neves nasceu em Aveiro a 28 Janeiro 1938. Chegou ao Canadá em 1964, passados 10 anos do primeiro grande fluxo imigratório de Portugal para este país. Em Toronto, a comunidade portuguesa vinha-se afirmando, através do aparecimento de alguns negócios, os primeiros jornais comunitarios, associações de apoio aos portugueses, e a abertura de filiais bancárias, entre outros. A fama do Canadá cimentava-se junto dos/as portuguesas, e o desejo de conhecer estes novo país crescia, um pouco por toda a parte.
José Henrique Neves, funcionário do Banco Português do Atlântico, em Aveiro, nao ficara imune a este novo mundo, contado e recontado por quem usufruia, como emigrante dos servicos daquela instituicao bancaria. “Lia e conversava muito sobre o Canadá com os emigrantes clientes do Banco, entusiasmando-me com o que ouvia. País novo, com muitas oportunidades e aberto a receber quem pudesse contribuir para o seu desenvolvimento decidi tudo fazer para tentar ir>
Em jeito de aventura, uma vez que Henrique Neves, nao tinha o perfil típico do emigrante, que deixava Portugal, dirigiu-se “ao Consulado e após várias entrevistas e exames médicos recebi ordem para embarcar. Começou aí a luta com a família, pois tendo um emprego estável na banca, e que na altura era um com que todos os jovens sonhavam, fui apelidado de louco, pois ia sair de onde muitos queriam entrar, sem contrapartidas. Ia à sorte e sem emprego. Não me preocupou essa situação pois nunca tive medo de arriscar. Não me arrependi, embarquei e fui recebido por um amigo chamado Joaquim Carreira, e o Cap. Valdemar Cruz Aveiro, um dos heróis dos mares da Terranova e Halifax, que me ajudaram nos primeiros dias.”
Pouco tempo depois de entrar no Canada, “aluguei um room and kitchen, como era habitual, quando alguem chegava. O meu ficava na Grace and College.” Recaorda Henrique Neves. Apos uma rápida adaptação, “comecei na National Trust Co, na Bay and Dundas. Dado que tinha experiência bancária não tive dificuldade em ser aceite, depois de uma exaustiva intrevista em francês e inglês, da qual me safei bem, tendo começado no dia seguinte. Na empresa passei pelo departamento o Mortgage Department. Ao principio tive dificuldades pois nem sabia como funcionavam hipotecas, dado que em Portugal faziam-se empréstimos para a compra de casa com um documento (letra), desde que alguém com bens ficasse como fiador, o chamado avalista. Mais tarde trabalhei nas empresas McLean Hunter e Chatelaine Publishing Co. Comecei no departamento de publicidade, passando mais tarde pelo departamento de crédito relacionado com facturação.”
A passagem por esta importante editora daria lugar depois aos negocoios na area da imobiliaria. “Por sugestão de um amigo, dediquei-me depois á actividade de agente imobiliário na imobiliária Mann & Martel Real Estate, que se dizia ser a maior do Canada, e na qual trabalhavam muitos portugueses como agentes.
Para a familia, a adaptação nao foi tao facil. “A minha mulher teve mais dificuldades. A par de ter emigrado contra vontade, começou por exercer a sua actividade numa fábrica de bonecos, seguindo-se numa de chocolates e finalmente numa companhia de seguros de nome, British & Western Co.”
A habitar nos inícios da decada de 60, “quasi no coração da comunidade portuguesa comecei por me interessar em conhecê-la. Verifiquei que era formada por gentes dos Açores, as quais trabalhavam na sua maioria na construção civil, fábricas e outras actividades variadas. As necessidades/dificuldades desses emigrantes, pessoas humildes, eram muitas, dado que se tratavam de pessoas que, sem habilitações académicas, não conheciam o básico da lingua inglesa.”
As questoes da lingua e o acesso a servicos sao alguns dos entraves a participacao e integracao dos novos imigrantes portugueses. “Não havia médico português, mas apenas um médico espanhol, o Dr. Saez) a quem os nossos compatriotas recorriam pela facilidade de o entender. Mais tarde, finalmente apareceu uma médica goesa de nome Melba Costa (Drª. Melba) que se tornou muito popular em Toronto entre a comunidade. Assistiu a minha mulher na gravidez até ao nascimento do meu filho. Dada a dificuldade com a lingua, acompanhei muitos amigos e conhecidos a arranjarem emprego e consequentemente a preencherem as “aplicações” para um trabalho, como lhe chamavam.”
José Henrique Neves, morando na rua Grace junto à College, acabaria por passar “acidentalmente por um edifício que tinha escrito no exterior Institut for New Canadians. Tratava de uma instituição, que tinha como finalidade ajudar quem chegava ao Canada e que, não tendo familia, não tinha aonde privar com compatriotas nem se divertir aos fim de semana. Havia várias actividades para lhes dar algum conforto. Durante a semana eram dadas aulas de inglês, e ajudava-se a encontrar alojamento, trabalho. Nesta instituicao, Henrique neves viria a conhecer, um outro portugues, com quem manteria uma relacao de amizade e trabalho.
“Entrei, dirigi-me á recepção e, após breves momentos a falar inglês com o recepcionista, o mesmo recepcionista se trilhou na gaveta da secretária. Em português vernáculo deu azo á sua ira. O individuo que era português, chamava-se Pina Fernandes, licenciado em Direito. Acabamos amigos e levei-o para a Mann & Martel enquanto estudava. Mais tarde colaboramos os dois no Jornal Portugues. Tinha-me cedido entretanto, uma posicao part-time no instituto, tendo-me eu mantido lá cerca de três anos. A finalidade daquela instituicao era receber os emigrantes recem chegados e que não tinham família nem casa.”
Em 1968, Henrique Neves e nomeado representante do Banco Português do Atlantico (BPA) junto da comunidade portuguesa. “No Canada, mantive sempre contacto com as direcções do BPA e um dia recebi uma carta da administração a solicitar que eu recebesse o Dr. Victor Horta, do Departamento Internacional que vinha visitar Toronto. Fui nomeado para representante e a minha missão era visitar com Vitor da Horta, os ainda poucos empresários que já havia, no sentido de captar as suas poupanças e incentivá-los a investir no nosso país. Lancamos assim a semente. Não havia escritório e este trabalho era feito a tempo parcial, pois não justificava ainda avançar mais. Mais tarde apareceu em Toronto um representante do extinto Banco Fonsecas & Burnay.”
Embora Henrique Neves nunca se tivesse lancado na comunidade como empresario individual, esteve envolvido conjuntamente com o empresario Humberto Carvalho, da House of Portugal Imports e Fernando Raposos, vendedor da Canadian Pacific Airlines, na criacao da Associacao Portuguesa dos Negociantes, cujos estatutos, fazem parte agora do espolio da biblioteca da galeria dos Pioneiros Portugueses para consulta.
“A convite do Sr. Carvalho, que era importador de mármores e outros, formamos uma associação comercial dos empresários portugueses, mas com pouco sucesso, por não haver aderentes e o seu lider, Humberto Carvalho se ter desinteressado.”
Como representante da Banco, o Banco Português do Atlantico teve tambem um papel importante no apoio de eventos socioculturais junto da comunidade portuguesas. “Patrocínamos vários eventos, entre os quais a organização da 1ª eleição da representante de Toronto para miss Portugal.”
As festas do natal tinham tambem um cariz especial para o BPA. Baseando-se numa iniciativa de sucesso que nascera “de um programa que já existia na RTP, que creio que se chamava hora da saudade, o qual nasceu durante a guerra nas antigas colónias”, Henrique Neves adapta-a aos imigrantes em Toronto e a radio. “Durante anos os nossos soldados enviavam esses desejos para as famílias – claro que na TV era outra coisa pois os pais viam os filhos – enquanto na rádio só ouviam. Poderia dizer que a ideia foi minha, mas não foi. Eram curtas mensagens que começavam com a identidade do imigrante e depois desejos de Bom Natal, “eu cá estou bem e tenho muitas saudades etc.”
Neves visitava no Natal “a casa dos nossos compatriotas, acompanhado de um pequeno gravador com o qual gravava os desejos de Boas Festas para famílias em Portugal. As cassetes eram enviadas para o Porto, onde se encontrava o Dr. Victor Horta, que por sua vez as enviava para a então Emissora Nacional para retransmitir.
Henrique Neves regressa a Portugal em 1974. “A última vez que aí estive foi em 1990.”
Humberta M. Araújo/Curadora